October 30, 2025

Desmatamento e Violência em Áreas de Conservação da Amazônia

Comunidades tradicionais sob ataque no estado do Pará, sede da COP30

(Nova York, 30 de outubro de 2025) — O governo brasileiro, que sediará a conferência global do clima COP30 em pouco mais de uma semana, no estado do Pará, deve agir com urgência e decisão para cumprir os compromissos ainda pendentes com as comunidades amazônicas que vivem e protegem a floresta, disse hoje a Climate Rights International (CRI) em um novo relatório e vídeo.

O relatório de 86-páginas, “Motosserras, Fumaça e Silêncio: Como a Negligência do Brasil com os Modelos de Conservação Comunitária Alimenta o Desmatamento e a Violência na Amazônia,” descreve como as áreas de conservação comunitária do Brasil — criadas para garantir a posse segura da terra e a proteção da floresta — estão sob ataque no Pará. Abrangendo cerca de 10 milhões de hectares, essas áreas preservam vastas extensões de floresta, mas enfrentam pressão constante: invasores armados desestabilizam a gestão coletiva, vendas ilegais de terras fragmentam comunidades e alimentam conflitos, e defensores ambientais sofrem ameaças ou são mortos. O medo impede que muitos moradores entrem nas áreas de floresta que são centrais para seus modos de vida e identidade.

“A Amazônia está se aproximando de um ponto de não retorno, e as áreas de conservação comunitária criadas para protegê-la estão sendo enfraquecidas pela negligência do governo e por invasões externas”, disse Sarah Sax, pesquisadora da Climate Rights International. “A incapacidade do governo de proteger essas comunidades agrava seu fracasso mais amplo em proteger a própria floresta.”

O novo relatório baseia-se em mais de 50 entrevistas com moradores de áreas de conservação comunitária no Pará, além de entrevistas com especialistas e autoridades, e análise de dados oficiais de desmatamento e conflito. O documento apresenta casos emblemáticos que mostram como os modelos de conservação comunitária estão sendo corroídos por invasões, grilagem de terras e violência.

O Pará é o epicentro do desmatamento e da violência na Amazônia. O estado lidera o ranking nacional de desmatamento há nove anos consecutivos e teve o maior número de casos documentados de violência contra defensores ambientais em 2023 e 2024.

O relatório destaca dois modelos de conservação comunitária — as Reservas Extrativistas (RESEX) e os Projetos de Assentamento Ambientalmente Diferenciados (PAE e PDS) —, ambos surgidos das lutas de base lideradas por Chico Mendes e pelo Conselho Nacional dos Seringueiros nos anos 1980. Com apoio estatal adequado, esses modelos podem proteger a floresta ao mesmo tempo em que promovem os meios de subsistência sustentáveis das comunidades locais — reconhecendo que esses objetivos são complementares.

Crescentes evidências de toda a Amazônia mostram que a proteção comunitária da floresta e do território pode ser uma barreira eficaz ao desmatamento, especialmente quando apoiada por uma governança sólida e direitos fundiários assegurados.

Mas, à medida que a pecuária e outros interesses econômicos avançam sobre a Amazônia, essas áreas se tornam cada vez mais vulneráveis a invasões e à grilagem — muitas vezes conduzidas por redes criminosas que violam os direitos das comunidades e impulsionam o desmatamento. Maria, moradora da Reserva Extrativista Riozinho do Anfrísio, afirmou:

“Há toneladas e toneladas de madeira que saem todos os dias das nossas RESEX. A gente escuta os tratores passando pelas nossas casas… Os moradores locais nem sabem mais como vão coletar castanha, porque os castanhais foram todos tomados por quem está operando lá dentro, que diz que a terra é deles, junto com os madeireiros que estão tirando a madeira. Ninguém vai mais lá—tudo foi tomado.”

Os moradores têm direito legal à concessão de uso da terra, mas os longos atrasos na emissão desses títulos resultam em falsos registros de propriedade, dificultam o acesso ao crédito e à assistência estatal para a produção sustentável de produtos florestais — como castanha, cacau e mandioca — e enfraquecem sua capacidade de defender seus direitos. O subfinanciamento governamental deixa os assentamentos sem escolas, atendimento de saúde ou transporte adequados, forçando famílias a abandonar suas terras.

Eliana da Silva, líder comunitária do PAE Lago Grande, que vive em uma comunidade remota ameaçada por invasões, disse:

“Nós sentimos falta do governo. Eles não trazem benefícios para as comunidades — por exemplo, a nossa saúde é precária, os ramais são precários, e não temos condições de escoar a produção da comunidade. Não há regularização fundiária, não temos. O governo absolutamente não nos traz nada — só promessas, promessas, promessas. E a gente continua lutando.”

Aqueles que denunciam ilegalidades enfrentam ameaças e violência. Darlon Neres dos Santos, jovem ativista do PAE Lago Grande que denunciou publicamente o desmatamento em 2023, relatou:

“A partir de 2023, as ameaças ficaram muito mais fortes. A gente recebeu a notícia de que estávamos sendo caçados, que eu estava sendo procurado por ter feito denúncia de retirada de madeira ilegal. Tive que sair da comunidade e deixar o território. Ainda hoje, há comunidades em que não posso estar porque sou visado. Mas nós não somos os criminosos nessa história. Os criminosos são aqueles que fazem as atividades ilegais. Nós estamos apenas lutando pela nossa floresta, pela nossa terra, pela nossa vida.”

O Brasil já possui o marco legal necessário para garantir o sucesso desses modelos de conservação, mas as instituições encarregadas de protegê-los são cronicamente subfinanciadas e têm equipes insuficientes, disse a Climate Rights International. Com mais recursos, as agências federais e estaduais poderiam acelerar a emissão das concessões de uso e aplicar as robustas leis ambientais do país, ao mesmo tempo em que combatem a impunidade por violações e atos de violência.

Doadores internacionais devem anunciar novos financiamentos para a conservação da Amazônia durante a COP30. O Brasil deve se comprometer a utilizar parte desses recursos para acelerar urgentemente a regularização e a formalização dos direitos fundiários das comunidades locais na Amazônia, acabar com a impunidade em casos de invasão de terras, ameaças e violência, e garantir recursos suficientes para as áreas de conservação comunitária.

“O Brasil criou modelos promissores para promover simultaneamente a conservação da floresta e os meios de vida sustentáveis, mas falhou em oferecer o apoio necessário para garantir seu sucesso”, disse Sax. “Na COP30, o governo Lula deveria se comprometer a resgatar esse ousado experimento — e a comunidade internacional deveria se unir para apoiá-lo.”

Apêndice: Citações Selecionadas

Maria (pseudônimo), moradora da RESEX Riozinho do Anfrísio

“Há toneladas e toneladas de madeira que saem todos os dias das nossas RESEX. A gente escuta os tratores passando pelas nossas casas… Os moradores locais nem sabem mais como vão coletar castanha, porque os castanhais foram todos tomados por quem está operando lá dentro, que diz que a terra é deles, junto com os madeireiros que estão tirando a madeira. Ninguém vai mais lá—tudo foi tomado.”

“Queríamos continuar vivendo aqui, dentro do nosso modo de vida, com nossos saberes que estamos acostumados aqui dentro. Mas estamos sofrendo muito impacto. Como é que a gente vai falar em preservação se dentro das nossas unidades de conservação está acontecendo essa devastação e a gente está impactado? Nós que cuidamos da natureza, nós que somos os guardiões da natureza, estamos sofrendo os impactos e ninguém está ligando. Ninguém está fazendo nenhum tipo de trabalho para combater o que está acontecendo aqui dentro.”

Rosa Maria Moraes Viegas, moradora da RESEX Renascer

“Eu sempre lutei muito—lutei pela criação desta reserva, pela sua implementação. Fui muito ameaçada, respondi a vários processos e sofri várias tentativas de morte. Depois tentaram matar a minha filha… Foi horrível. Aqui mesmo, no meio da comunidade, e todo mundo assistiu.”

Darlon Neres, jovem liderança do PAE Lago Grande

“Nós estamos protegendo este território para que vocês, no mundo, possam ter vida. Estamos protegendo para que vocês possam continuar a existir. Sem florestas, não há cidades. Estamos protegendo vocês porque vocês precisam de água. Estamos protegendo vocês porque vocês precisam de oxigênio para respirar.”

“Quando decidi dedicar a minha vida a lutar por este território, fiz uma escolha — uma escolha que afetou minha vida pessoal, minha vida familiar, minha vida profissional. Eu não me vejo fora deste território. E eu não posso ver este território destruído.”

Eliana da Silva, líder comunitária de Nazário, PAE Lago Grande

“Nós não vivemos aqui apenas entre árvores, pássaros e animais; há pessoas que cuidam, que protegem, que preservam essa grande natureza. Se este assentamento e seus defensores não existissem, nada disso ainda estaria de pé — nem a floresta, nem as árvores. A ganância é imensa, mas nós não vamos ceder.”

Foto de capa: Toras de madeira nobre derrubadas bloqueiam a entrada do PDS Esperança, um assentamento de desenvolvimento sustentável no estado do Pará. Seu tamanho, a ausência de plaquetas de identificação e a localização dentro do assentamento sugerem atividade de extração ilegal de madeira, um problema recorrente relatado por moradores. Crédito da foto: Sarah Sax para a CRI.

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